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O caos planetário do lixo
SÉRIE
03 Junho 2019 | Por Márcia Pimentel
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Descarte seletivo na E.M. Castro Alves. Alberto Jacob Filho, 2019, MultiRio

Seis anos antes de o programa Informática Educativa ser lançado nas escolas municipais do Rio de Janeiro, em 2001, a E.M. Castro Alves (9ª CRE), em Campo Grande, já havia comprado dois computadores e uma impressora. Um deles foi colocado na Sala de Leitura, para deleite das crianças, que ficaram encantadas com o acesso à nova tecnologia. Como a unidade conseguiu o feito? Juntando latinhas de alumínio para revender a uma empresa especializada em reciclagem.

Por quase dois anos, o projeto mobilizou professores, funcionários, alunos e responsáveis, que abraçaram a tarefa de catar latinhas e levar à escola. Quem vislumbrou que o lixo poderia gerar renda extra, suficiente para viabilizar a compra de um dos primeiros computadores da Rede Pública de Ensino do Rio de Janeiro, foi Elsa da Silva Lopes, diretora da Castro Alves até hoje. Além disso, a empreitada também se constituía em uma oportunidade de ensinar às crianças o necessário compromisso com o meio ambiente.

Quando o projeto da escola estava a pleno vapor, em 1994 e 1995, a humanidade gerava menos da metade do lixo que produz hoje. Segundo a ONU, já são dois bilhões de toneladas de resíduos lançados no meio ambiente, anualmente, e a perspectiva é que esse número dobre até 2050. Não por acaso, o problema está relacionado a vários Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 das Nações Unidas, em especial os de número 12 (Consumo e Produção Responsáveis) e 14 (Vida na Água).

Também não à toa, a reciclagem e a coleta seletiva – que, de fato, minimizam o impacto dos resíduos sólidos no meio ambiente – já não são a pauta mais atual dos ambientalistas e da ONU, quando se trata do assunto lixo. Hoje, a palavra de ordem é a redução do consumo e a instauração de novos paradigmas de produção.

Limites da reciclagem

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A humanidade já produz dois bilhões de toneladas de lixo ao ano. Foto Maol, Flickr, cc

A questão do lixo é um dos mais graves problemas ambientais do planeta, na atualidade. O que fazer com tantos resíduos descartados no ambiente, quando até mesmo a reciclagem gera poluentes e mostra seus limites? A incineração do lixo plástico, para sua reutilização, por exemplo, provoca uma fumaça densa e altamente tóxica. Além disso, o custo para reciclar determinados materiais é tão alto que impossibilita empreendimentos.

Mesmo assim, a coleta seletiva e a reciclagem continuam sendo fundamentais, não só porque poupam recursos naturais, mas também porque são capazes de dar uma destinação mais correta aos resíduos. Mas para a ONU e os ambientalistas, está claro que não são o remédio para todos os males gerados pelo lixo. Até porque apenas 10% dos resíduos do planeta são reciclados.

A China, que importava cerca de 70% do lixo reciclável do mundo, está cada vez menos disposta a ser o destino dos resíduos do planeta. Aprovou, no ano passado, leis que proíbem a compra de mais de 30 tipos de resíduos, entre eles plástico, hardware, ferragens, madeiras e papéis que não tenham passado por triagem. O argumento é que a proibição faz parte do esforço chinês em ampliar a proteção ambiental e reduzir as doenças provocadas pelas montanhas de lixo aos seus cidadãos. Nem é preciso falar que a decisão impactou a indústria da reciclagem mundialmente, além do manejo do lixo em vários países.

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Objetos de material reciclado feitos por alunos e professores. Alberto Jacob Filho, 2019, MultiRio

Para Marco Lambertini, diretor-geral do Fundo Mundial para a Natureza (WWF), o planeta suporta cada vez menos o modelo atual. “As pessoas têm plantas em seu apartamento, mimam seus cachorros, suprindo seu desejo de natureza de forma artificial e esquecendo-se do que ocorre com a verdadeira natureza, ali fora. É difícil, mas precisamos passar por uma revolução cultural que valorize verdadeiramente a natureza, que lhe dê, no sentido próprio, um valor”, disse à Agence France Press (AFP).

A necessidade de uma transformação cultural ampla, que atravesse toda a sociedade, também é percebida pela escola, nos detalhes do cotidiano. Nilcéa Lima de Freitas, coordenadora pedagógica da E.M. Castro Alves, diz que foi preciso fazer um trabalho específico para tentar transformar o hábito dos alunos de jogar lixo na rua, apesar de toda a conscientização sobre as mudanças climáticas e de todo o esforço pedagógico em torno da coleta seletiva e do reaproveitamento dos materiais e dos alimentos.

Plástico, um arquivilão

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Ilha de plástico se formando no Pacífico. Cc

Cerca de 15% do total do lixo planetário é plástico. Existem 13 mil pedaços desse material a cada quilômetro quadrado de mar, afetando a vida marinha e a capacidade dos oceanos de regular ciclos importantíssimos para a Terra, como a produção de oxigênio.

Foi formada uma gigantesca ilha de plástico no Pacífico, entre o Havaí e a Califórnia, formada por 80 mil toneladas de dejetos pouco degradáveis e com tamanho duas vezes maior que a França, segundo o periódico Scientific Reports, em publicação do ano passado. Embora seja a maior de todas, não é a única ilha de plástico de nossos oceanos.

Estimativa divulgada pelo Fórum Econômico Mundial de Davos indica que, até 2050, os oceanos terão mais pedaços de plástico do que peixes, se o descarte desse material continuar no ritmo atual. Hoje, a humanidade compra um milhão de garrafas pet a cada minuto e todos os anos utiliza cerca de 500 bilhões de sacolas plásticas descartáveis.

O problema não para por aí. Como 40% de todo o lixo do mundo é queimado, o plástico contido nele libera gases tóxicos na atmosfera, como dioxinas, furanos, mercúrio e bifenilos policlorados, que podem causar câncer, doenças respiratórias e mau funcionamento da tireoide, entre outros males.

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É tanto plástico no mar, que já começou a entrar na cadeia alimentar de animais marinhos. Share America, cc

Embora o plástico tenha se transformado no maior vilão dos detritos descartados pela humanidade, em função do volume, ele está longe de ser o único a causar estragos graves aos ecossistemas e à saúde.

As pilhas e as baterias, por exemplo, quando lançadas a céu aberto, podem contaminar o solo e os lençóis freáticos, por serem constituídas de metais altamente tóxicos, como o mercúrio, o chumbo e o cádmio. Por isso, a coleta seletiva é estratégica e fundamental, pois só com ela é possível dar a destinação correta a esses e aos diversos tipos de lixo.

Cariocas desconectados

As áreas urbanas são as grandes responsáveis pela enorme produção mundial de lixo. O Rio de Janeiro se inclui nessa realidade e é responsável por 0,2% dos resíduos (quatro milhões de toneladas ao ano) produzidos no planeta. Pode parecer pouco, mas é muito, proporcionalmente, já que a população do município (6,7 milhões) corresponde a menos de 0,1% do total mundial (7,6 bilhões).

Para ter uma noção mais precisa da quantidade de resíduos gerados pelos cariocas, é preciso levar em conta que o Rio é a segunda cidade do país que mais produz lixo e que o Brasil ocupa o quarto lugar no ranking mundial de produção de detritos plásticos. Apesar disso, os caminhões de coleta seletiva da Comlurb circulam pela cidade com ocupação inferior à sua capacidade, pois a maioria da população ainda não aderiu ao descarte seletivo de seus resíduos.

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Alunos da E.M. Castro Alves preparam a Semana do Meio Ambiente com antecedência. Alberto Jacob Filho, 2019, MultiRio

Para o diretor-geral do WWF, Marco Lambertini, essa desconexão com as necessidades da natureza é perigosa. Há 50 anos, o mundo tem passado pelo crescimento exponencial do consumo de tudo: energia, água, madeira, peixes, alimentos, fertilizantes, pesticidas, minerais.... “É evidente que isso não é sustentável. Estamos chegando a patamares críticos”, diz.

No contexto que o mundo vive hoje, a Educação Ambiental e a Semana do Meio Ambiente, comemorada na primeira semana de junho, ganham importância especial. Quem sabe não seja esta geração de jovens e crianças que vá promover a revolução cultural de que o planeta tanto precisa.

 
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