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Espanhóis no Brasil: o início da luta por uma jornada de trabalho mais humana
06 Maio 2014 | Por Larissa Altoé
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Imagem 3 bar2A imigração espanhola com destino ao Rio de Janeiro aconteceu de forma mais expressiva do final de 1890 a 1940. Foi constante, embora menor, se comparada com o número de portugueses e italianos que chegaram na mesma época. Os espanhóis vinham das regiões mais pobres do país, como Galícia e Andaluzia. Não se sabe ao certo quantos eram, mas, no Brasil, estima-se que somavam cerca de meio milhão de pessoas.

A emigração se devia à pobreza no meio rural e, a partir de 1930, também à destruição e às dificuldades trazidas pela Guerra Civil Espanhola.

Na virada do século XIX para o XX, os espanhóis, como todos os imigrantes que chegavam ao porto do Rio de Janeiro, eram registrados pela Agência Central de Imigração e encaminhados para a hospedaria da Ilha das Flores, com o objetivo de se restabelecerem da longa travessia do Atlântico. 

Os “braceros”, como eram chamados, se fixaram principalmente nas áreas centrais da cidade, incluindo a zona portuária. Disputavam ofertas de empregos menos qualificados e espaços de moradia disponíveis com os segmentos mais pobres da população local, sobretudo mestiços e negros. Encontravam trabalho como estivadores, ensacadores de café, em bares, pensões ou comércio ambulante. A expressão “galego” servia para se referir a pessoas vindas da Península Ibérica, tanto de Portugal como da Espanha.

Movimento operário

Os espanhóis eram, em geral, mal remunerados, com jornadas de trabalho de até 16 horas. Moravam em habitações coletivas – os populares cortiços – que escaparam da demolição com o plano de remodelação e saneamento da cidade.

Conseguiam algum auxílio médico, financeiro e jurídico junto às Caixas de Socorro Mútuo, entidades particulares mantidas por imigrantes mais prósperos, que, provavelmente, deram origem às primeiras organizações de trabalhadores. O imigrante espanhol teve ativa participação no movimento operário dos maiores centros urbanos brasileiros, sendo rotulado de anarquista, no início do século XX. Eles se reuniam em associações, como o Centro Cosmopolita (setor de hotelaria) ou a União dos Empregados de Padaria.

No entanto, é certo também que parte da comunidade não queria se envolver com questões políticas. A organização se baseava em laços de parentesco. Os primeiros empregos eram indicações de patrícios e, quando o imigrante melhorava suas economias, comprava um pequeno negócio, contratando, por sua vez, conterrâneos. Muitos deles eram comerciários e garçons. Em geral, quem conseguia prosperar economicamente não queria confusão. As manifestações em busca de melhores condições de trabalho eram duramente reprimidas pela polícia.

Mas havia aqueles que se tornavam líderes sindicais, ativistas anarquistas e assalariados que se uniam às associações de sua classe para melhorar as próprias condições de vida. Tanto foi assim que o Centro Galego, um local de reunião e confraternização, situado na Rua da Constituição, cedeu suas instalações para celebrar o Primeiro Congresso Operário Brasileiro, em 1906, reunindo, pela primeira vez, trabalhadores de todo o Brasil.
Na greve geral de 1917, diversos espanhóis do setor mais importante do operariado carioca – o têxtil – estiveram envolvidos. Em uma fábrica de tecido, no bairro da Gávea, foram presos 78 anarquistas, entre eles vários espanhóis, suspeitos de utilizarem bombas e armas nas manifestações.

Deportação por serem anarquistas

A pesquisa de Érica Sarmiento da Silva para a publicação Maracanan, da Pós-Graduação em História da Uerj, conta que, por causa das atividades nas associações de trabalhadores, muitos espanhóis foram deportados. Como, por exemplo, Antonio Fernández, natural de Porriño (província de Pontevedra), sapateiro, que chegou ao Rio de Janeiro em 1912, com 21 anos. Antonio era empregado em uma loja de calçados na Rua Senhor dos Passos, centro da cidade. Fora do seu ambiente de trabalho, era membro da Aliança dos Operários em Calçado e Classes Anexas.

No seu processo de expulsão, um Agente do Corpo de Segurança Pública, que figura como testemunha, disse que Antonio era eloquente orador e tinha discursado no Primeiro de Maio, em uma manifestação na Praça Mauá, aconselhando ao povo a implantação do regime anarquista. A mesma testemunha de acusação relata um discurso semelhante do sapateiro nas sacadas da Sociedade dos Marceneiros, cujo fundador também era espanhol: Manuel Pérez Fernández, que por sua vez também foi expulso do Brasil em 1919.imagem 5 oficina2

Sheldon Maram, estudioso do movimento operário no Rio de Janeiro, diz, em seu livro Anarquistas, Imigrantes e o Movimento Operário Brasileiro, 1890-1920, que “os imigrantes dominavam os sindicatos mais poderosos e mais influentes da capital federal, incluindo o sindicato dos trabalhadores em construção civil, o Centro Cosmopolita e a organização dos trabalhadores de hotéis, bares e restaurantes. Esses dois sindicatos, cujos membros provinham, principalmente, de Portugal e Espanha, estavam à testa do movimento operário em sua fase mais ativa, de 1917 a 1920, liderando greves (...)”.

Nas greves que aconteceram no Rio em 1920, os trabalhadores reivindicavam melhores condições de trabalho. Era o caso dos cozinheiros do Centro Cosmopolita em 1912, que queriam a redução da jornada de trabalho para 12 horas e o descanso semanal.

No início do século XX, pertencer a determinados sindicatos era um “convite” para regressar ao país de origem. Foi em grande parte graças à coragem e às ideias trazidas ao Brasil pelos imigrantes galegos que a jornada do trabalhador brasileiro tornou-se menos árdua.

Casa de España

O fato é que a comunidade espanhola seguiu vivendo no Rio de Janeiro e sua contribuição cultural permanece aqui no século XXI. De acordo com Mônica Mosquera, diretora da Casa de España, hoje são 6 mil espanhóis vivendo no Rio de Janeiro (dados do Consulado Espanhol), e a maioria deles se dedica ao comércio.

Os vínculos entre eles são mantidos através da Casa de España, um clube no bairro do Humaitá, que oferece cursos de língua, de dança flamenca e promove apresentações de danças e eventos anuais para celebrar a identidade espanhola: a Galega, no terceiro domingo de setembro, e a Hispanidad, no terceiro domingo de outubro. Nas duas, encontram-se muitas barraquinhas com comidas e produtos típicos, não só da Espanha, mas de vários países que foram colonizados pelos espanhóis na América, como Chile e Argentina. A Casa oferece também suporte assistencial e filantrópico para o imigrante e descendente espanhol.

As atuais entidades de assistência aos imigrantes, localizadas na Casa de Espanha, são: CHAS –Comunidade Hispânica de Assistência Social, CRE-RJ – Conselho de Residentes Espanhóis e CSAM – Centro Social de Atividades para Maiores. Também apoiam membros espanhóis na inscrição em alguns programas regulares da Xunta de Galícia, com informações, documentação e envio para Espanha.

Outra importante referência para a comunidade espanhola no Rio de Janeiro é o Hospital Espanhol, situado na Rua Riachuelo, 302, Centro. Mantido pela Sociedade Espanhola de Beneficência, presta todo tipo de auxílio médico, de emergências a cirurgias. Atualmente, 500 espanhóis estão cadastrados e muitos outros são encaminhados gratuitamente, por meio do Consulado.

 
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