Quando se fala em tombamento, em geral se pensa em patrimônio arquitetônico. Mas a cidade do Rio de Janeiro inclui, entre seus bens protegidos, muito mais do que prédios históricos, construções e casario – o inventário inclui a arborização urbana. Representantes de espécies importantes e exemplares centenários de palmeiras, tamarineiras e figueiras, entre outros, se encontram espalhados por diversos bairros cariocas, testemunhando silenciosamente as transformações ao seu redor. Vale a pena conhecer, se possível ao vivo, as chamadas “árvores notáveis” e fazer despertar, de preferência nas crianças, a importância do patrimônio vivo do Rio, promovendo a conscientização contra o vandalismo e a simpatia pela causa do meio ambiente. O tombamento de árvores está previsto pelo artigo 7 da Lei Federal 4.771/65 do Código Florestal.
Quinta da Boa Vista é um dos casos mais antigos
A proteção ao conjunto vegetal se aplica a várias áreas livres da cidade, como o Passeio Público, o Parque do Flamengo, o Campo de Santana e a Quinta da Boa Vista. Tombada pela União em 1938, a antiga residência da família imperial brasileira resulta de um projeto de autoria do botânico Auguste François Marie Glaziou, que foi o pioneiro da arborização urbana no país. Em 1860, D. Pedro II encomendou ao paisagista uma série de melhorias que deveriam dar continuidade ao trabalho iniciado por D. Pedro I, que ordenou o plantio de centenas de árvores a partir da mudança do Paço da Praça Quinze para o de São Cristóvão, em 1816. Glaziou mandou construir lagos, grutas e cascatas artificiais, em moda na época. Nesta, que é uma das principais áreas de lazer da Zona Norte da cidade, predominam espécies botânicas exóticas, como a figueira africana, o flamboyant, o jameloeiro e a tamarineira. Mas o grande espetáculo é a explosão de flores entre os meses de setembro e outubro, na Alameda das Sapucaias, que o francês tratou de instalar diante do portão de acesso principal do palácio.
Figueira virou símbolo da luta pela preservação ambiental da cidade
Atualmente, a legislação institui não apenas conjuntos arbóreos, como também uma árvore isolada como “imune ao corte”. Inconfundível pela imponência de sua copa, com 35 metros de diâmetro, um exemplar da Ficus tomentella foi a primeira a ser tombada pelo Conselho Municipal do Patrimônio Cultural, em 24 de setembro de 1980, quando o prefeito Júlio Coutinho assinou o decreto 2.783. Situada na Rua Faro, nº 51, no Jardim Botânico, ela estava prestes a ser derrubada para dar lugar à construção de um prédio e só escapou do corte porque os moradores do bairro saíram em protesto. Originária do Oriente Médio, é a única sobrevivente de uma fileira plantada ainda no século XVII.
Espécie amazônica foi parar em Copacabana
O assacu (Hura crepitans) atinge a altura de um prédio de sete andares e fica em frente ao nº 94 da Rua Pompeu Loureiro. É bem provável que o espécime centenário só tenha chegado aos dias de hoje graças à visão de Otto Schuback, que registrou em cartório um pedido inusitado quando vendeu o terreno: a árvore não poderia ser derrubada antes que ele morresse. Embora falecido em 1968, o zelo ficou para a posteridade, até que o exemplar foi tombado em 2006. Copacabana tem, ainda, um oitizeiro, duas amendoeiras e dois algodoeiros-do-pará, protegidos, que ficam nos fundos de um edifício na Rua Ministro Viveiros de Castro, nº 110.
Patrimônio verde está em todo canto da cidade
Ainda na Zona Sul, são tombadas as 166 figueiras que enfeitam a Avenida Visconde de Albuquerque, no Leblon, por obra do mestre Glaziou. Na Glória, um conjunto de amendoeiras e o jardim da Praça Paris e da Praça Marechal Deodoro da Fonseca são parte do patrimônio. A primeira praça foi construída em 1926, a partir do projeto do urbanista francês Alfredo Agache, durante a gestão do prefeito Antônio Prado Júnior. Botafogo conta com um pau-ferro, também conhecido como jicá, em frente ao nº 64 da Rua Marquês de Olinda. Excepcionalmente, a data de aniversário da árvore é conhecida, já que ela foi plantada em frente ao solar do Comendador Antônio Joaquim, em 5 de julho de 1867, como forma de comemorar o nascimento de suas netas.
Desde 1914, quando o Grajaú nasceu como um bairro projetado, 207 tamarineiras estão plantadas nas avenidas Engenheiro Richard e Júlio Furtado. Na Praça Afonso Pena, há exemplares de pau-ferro, oitis, figueiras e cássias tombados. Também na região da Tijuca, casuarinas margeiam o Rio Trapicheiro, ao longo da Avenida Heitor Beltrão. Uma figueira-brava, também conhecida como mata-pau, do gênero Urostigma, vive há pelo menos um século na Rua Mariz e Barros, em frente ao nº 678. Na Rua Haddock Lobo, nº 220, foi tombado um conjunto arbóreo extenso, que inclui 70 goiabeiras, 5 palmeiras imperiais, 1 mogno, 1 jacarandá-da-baía, 4 coqueiros, 2 mangueiras, 1 cajazeira, 1 caramboleira e 1 ipê branco.
Bangu conta com uma palmeira tipo babaçu no rol das notáveis, na Rua Silva Cardoso, nº 120. A Orbignya speciosa é uma das mais importantes palmeiras brasileiras e pode chegar a 20 metros de altura. Tamarineiras centenárias ficam na Rua Chita e podem ultrapassar os 25 metros. Na Avenida Santa Cruz, em frente à Fábrica Bangu, um conjunto de exemplares da palmeira-imperial data da construção do prédio, em 1889. De acordo com especialistas, a Roystonea oleraceae chega a atingir 40 metros.
Na Penha, há 54 palmeiras devidamente tombadas nas ruas Patagônia, Quito e do Couto. Em Paquetá, foi tombado um conjunto de 10 árvores – uma amendoeira, uma jaqueira, uma algodoeira, mangueiras e tamarineiras. Mas a grande atração fica na Praia dos Tamoios: um baobá, apelidado pelos moradores de Maria Gorda. Também não se sabe como a espécie originária do continente africano foi parar na ilha. Existem, também, os chamados “conjuntos extraordinários” – exemplares tombados e imunes ao corte em diversos outros bairros do Rio: Alto da Boa Vista, Itanhangá, Pechincha, Freguesia, Recreio, Sepetiba, Ilha do Governador, Santa Cruz, Parada de Lucas, Magalhães Bastos, Urca, Lagoa, Santa Teresa, Laranjeiras e Catete.
A importância das árvores no meio urbano
A preservação da arborização urbana é apenas um primeiro passo em direção à civilidade. Sem perder de vista que as árvores precisam estar em harmonia com as edificações e a rede elétrica, e em bom estado para não ameaçar a segurança dos habitantes, transformá-las em patrimônio da cidade vai bem além de apenas instalar uma placa informando que não podem ser cortadas. Cada morador das redondezas pode fazer a sua parte, observando como anda o seu estado e solicitando poda ou tratamento aos órgãos competentes.
Em contrapartida, o verde oferece inúmeros benefícios para a população. A começar, porque serve de refúgio para a fauna remanescente na cidade, provocando, com isso, o aumento da consciência ambiental e uma sensação de maior pertencimento à comunidade. Áreas arborizadas sofrem menos erosão e risco de desabamentos. Cortinas vegetais são um triplo agente de controle da poluição: podem baixar em até 4°C a temperatura ambiente, servem como barreira contra a propagação de ruídos e até amenizam problemas respiratórios, já que reduzem em até 10% o nível de partículas poluentes do ar. A contemplação da natureza já foi comprovada, cientificamente, como um fator positivo na melhoria da saúde física e mental, pois provoca a redução do estresse.
Nunca é demais lembrar que o Brasil é signatário da Convenção de Proteção da Biodiversidade das Nações Unidas.
Fontes: Guia do Patrimônio Cultural Carioca – Bens Tombados 2014, site da Fundação Parques e Jardins, jornal O Globo e revista Veja Rio.
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