“Gosto de ver a descoberta que envolve a alfabetização”. Desse modo, Therezinha Glória Barbosa da Silva, 61 anos, professora da E.M. Alphonsus de Guimaraens (7ª CRE), na Cidade de Deus, traduz o prazer que tem em trabalhar com o 1º ano do Ensino Fundamental.
Ela também aponta dificuldades na realização da tarefa: falta de consciência dos responsáveis sobre a importância da escola e a consequente ausência dos alunos em sala de aula, sem motivo plausível; crianças excessivamente agitadas por não terem diálogo em casa nem condições tranquilas de existência (uso de drogas por parte dos adultos, pai ausente, não contam com áreas seguras de lazer e alimentação de qualidade).
Therezinha leciona para duas turmas, uma no turno da manhã e outra no da tarde. Devido à heterogeneidade dos estudantes, mescla a forma tradicional de ensinar com técnicas mais lúdicas e o uso de materiais concretos. Inicia com o caderno pedagógico da Secretaria Municipal de Educação, copiando em papel palavras e frases a serem fixadas na sala de aula para que todos possam visualizar constantemente. Outro recurso frequente é a contação de histórias.
A professora é fã do alfabeto móvel fornecido pela SME – letras coloridas que podem ser manipuladas – e o utiliza nas provas, quando estimula os alunos a pensar e buscar o som da letra, a formação das sílabas e das palavras.
Amarelinha, gincana e aprendizado
Em alguns momentos, é preciso lançar mão da ludicidade, e Therezinha propõe para a turma a brincadeira da amarelinha, na qual as casas possuem sílabas e o desafio é formar uma palavra, por exemplo, ‘cebola’. O aluno deve, então, saltar apenas nas casas ‘ce’, ‘bo’ e ‘la’. Os colegas prestam atenção e conferem se ele conseguiu.
Às vezes, usa a gincana, unindo pares de alunos com desempenho satisfatório e em defasagem, de forma que quem está atrasado no aprendizado possa se interessar e progredir. As duplas devem ir ao quadro e escrever a palavra que a professora pede: bala, galinha etc. Vence a dupla que tiver menos erros.
No caso da Matemática, Therezinha desenha um caracol, escrevendo os numerais em sua concha espiralada. Para chamar a atenção dos números pares, pinta-os de vermelho.
As turmas têm 28 alunos cada. Segundo a professora, no final do ano, 15 deles conseguem ler e escrever palavras simples de até três sílabas. Desses 15, 5 também conseguem contar unidades e dezenas, além de ler em voz alta para a classe. Dos outros 13 estudantes, 8 costumam terminar unindo sílabas e 5 são considerados ‘problemáticos’, ou seja, mostram-se resistentes ao aprendizado ou manifestam algum tipo de sintoma, como a necessidade de ficar andando pela sala constantemente.
Trajetória
Therezinha fez o curso Normal e dedicou-se a dar aulas particulares em casa. Teve três filhos e graduou-se em Geografia pela Federação de Escolas Simonsen. Quando se separou do marido, um dos filhos incentivou-a a prestar concurso para a Prefeitura do Rio. Ingressou no município há 13 anos. Sua primeira lotação foi na E.M. Professora Zélia Carolina da Silva Pinho (10ª CRE), em Santa Cruz. Depois, foi transferida para a E.M. Alphonsus de Guimaraens, onde leciona atualmente. Em ambas, dedicou-se à alfabetização.
Fez uma pós-graduação lato sensu em Psicopedagogia, na Universidade Gama Filho, em grande medida para entender e lidar com a ansiedade de não conseguir alfabetizar com sucesso uma parte dos alunos que chegam à escola. “Precisava compreender que não era uma missão exclusivamente minha. Havia outras questões envolvidas”, relata. Em 2015, passou no concurso para 40h no município e aguarda ser chamada.
Às quartas-feiras, estuda inglês à noite, para aprimorar a língua e ganhar desenvoltura nas viagens de férias. Ela conta que que já foi a Orlando e Miami, nos Estados Unidos. A próxima cidade norte americana a conhecer já está definida: Nova York. Nas horas de folga, aprecia assistir filmes on demand na TV e ler.
Atualmente, mora sozinha no Pechincha e visita a mãe com regularidade no bairro vizinho da Taquara. Conta com orgulho que um dos cinco netos, Luiz Henrique Nunes, acaba de ganhar com os colegas de classe a feira de Ciências do Sistema Colégio Militar do Brasil, que reuniu 300 projetos sobre como tornar as unidades escolares sustentáveis. O projeto criado pelo neto de Therezinha e seus amigos propõe um novo sistema de refrigeração para a escola na qual estudam, em Manaus. O sistema é baseado no aproveitamento da energia solar e pode reduzir a zero o custo do uso de ares-condicionados na instituição.
